* Por Rachel Cesar
A EJACULAÇÃO PRECOCE E OS SEUS FATORES PSICOGÊNICOS
Introdução
Um transtorno de ejaculação a tempos atrás em nossa cultura ocidental não era considerado um problema, já que a nossa civilização sempre foi liberal com a sexualidade masculina. As necessidades sexuais femininas eram ignoradas, pois bastava que o homem alcançasse o prazer, não esperando nenhuma satisfação de sua parceira.
A busca pela sensação orgásmica feminina começou a aparecer pela década de 80 com os movimentos de equidade de género, tornando possível a liberdade sexual e a experimentação do prazer sexual por ambos os sexos. Por estas razões, a ejaculação precoce só começou a ter significação clínica quando a mulher alcançou o “direito” a uma vida sexual mais prazerosa. A ejaculação precoce é por definição, uma disfunção da resposta sexual masculina que ocorre na fase do orgasmo.
Será mesmo Ejaculação precoce?
Por um lado, os casais passaram a comunicar como nunca sobre os seus gostos e preferências sexuais. Por outro, a obsessão pelo prazer feminino trouxe de volta o comportamento egocêntrico e até insensível adotado no passado pela figura masculina. Isso porque muitos indivíduos podem se considerar ejaculadores precoces quando na verdade não o são.
De maneira comum as mulheres podem levar mais tempo para atingir o auge da excitação sexual, passando a exigir do homem maior continência ejaculatória, culpando-o pelo prazer que não conseguem obter. Outras, talvez anorgásmicas, poderão também aumentar a pressão sobre os seus parceiros.
Neste caso, a incapacidade pode ser projetada no parceiro quando na verdade ela é quem carrega a disfunção. Assim, aquilo que seria considerado precoce deve ser avaliado com mais atenção já que o tempo que cada um desprende para alcançar o prazer é muito relativo e particular. Este critério qualitativo é reforçado por Masters e Johnson ao associar à mulher a responsabilidade de definir se o homem é ou não um ejaculador precoce, já que a habilidade de retardar a ejaculação seria confirmada pela parceira funcional e capaz de perceber o próprio tempo de alcance do orgasmo.
Causas orgânicas
A ejaculação precoce pode apresentar causas orgânicas e psicológicas. Segundo Kolodny et al. (1982, p. 525), a ejaculação prematura “é um fenômeno reflexo regulado por vias neurológicas e possivelmente endócrinas; não obstante disso, a evidencia clinica indica que constitui também um forte componente aprendido no processo”. A disfunção está relacionada a uma inibição adquirida por condicionamentos durante uma situação aversiva e desagradável associada a uma resposta sexual.
As causas orgânicas para a ejaculação precoce podem ser decorrentes de anormalidades prostáticas ou inflamação dos órgãos genitais, exceto nos casos de indivíduos nos quais a disfunção surge após um período de funcionamento adequado e sem causa psicológica aparente ou que sofreram intervenção cirúrgica prostática. A ejaculação precoce de origem constitucional, por exemplo, é típica de pessoas que possuem predisposição biológica inata ao reflexo ejaculatório precoce. Nestas situações, a ejaculação precoce é primária e generalizada.
Este transtorno ejaculatório também pode ser decorrente de certas enfermidades neurológicas: (tabes dorsalis, esclerose múltipla, neuropatias periféricas por alcoolismo ou diabetes) ou traumatismos (craniano, medular ou do sistema nervoso periférico). Nesses casos, o comprometimento orgânico é tão evidente que o quadro disfuncional perde sua relativa importância.
As mais frequentes causas de ejaculação precoce são as infecções das vias urinárias, como as prostatites. A ejaculação precoce pode de forma invulgar ser determinada farmacologicamente, pois o comum é a influência dos fármacos na ejaculação retardada. Pode aparecer, por exemplo, na síndrome de abstinência de opiáceos ou ao se suspender o uso da trifluoperazina (Cavalcanti & Cavalcanti, 2012).
Ansiedade na hora H
Para compreender o impacto psicológico que a disfunção ejaculatória apresenta é preciso relevar o tempo e a qualidade das relações sexuais, já que o padrão repetitivo da ejaculação prematura contribui para o aumento da ansiedade e do sentimento de frustração que o homem experimenta. Mas para ser considerada um problema, a ejaculação deve aparecer de forma involuntária e antes que o indivíduo a deseje. Em outros casos, a ejaculação pode aparecer diante dos mínimos estímulos sexuais, bastando que o homem se sinta excitado.
A falta de controle da ejaculação durante o ato sexual e resulta na apreensão acerca da incapacidade para perceber os primeiros sinais que precedem a ejaculação. Isso porque uma outra causa de ejaculação precoce é o excesso de preocupação em satisfazer o par amoroso no ato sexual, que pode fazer com que o homem se distraia das próprias sensações, perdendo o foco de si mesmo e dificultando o autocontrole.
As fases da disfunção sexual
A partir do modelo trifásico de resposta sexual proposto por Kaplan (1983), passou-se a explicar as fases da disfunção sexual primeiramente em três momentos que dividem em fase primária, secundária e situacional: Se a ejaculação precoce esteve presente ao longo da vida, significa que o homem a tem enfrentado desde que se tornou sexualmente ativo. Já se a disfunção foi adquirida, significa que esta perturbação começou a aparecer apenas após um período de função sexual relativamente normal. Se é situacional, ocorre apenas com determinados estímulos, situações ou parceiros. Quando é considerada generalizada, isso quer dizer que acontece diante de qualquer estímulo, situação ou parceiros.
Fatores Psicogênicos
Dessa maneira, a identificação dos fatores psicogênicos é eficaz para montar um quadro psíquico desta disfunção e compreender as situações reforçadoras que podem estar acentuando esta resposta sexual indesejada. Podem ser relevantes na avaliação desta disfunção sexual:
- Fatores da relação (falhas de comunicação, cobranças, desgaste diádico, medo do abandono, excesso de entusiasmo);
- Fatores situacionais (falta de privacidade, pouco tempo para ter relações);
- Fatores sexuais (inexperiência sexual, não conhecer bem o próprio corpo e as formas de excitá-lo, longo período de abstinência sexual, medo de não conseguir manter a ereção);
- Fatores de vulnerabilidade (imagem corporal fraca, história de abuso sexual ou emocional, depressão, ansiedade, stress, perda de emprego, luto);
- Fatores culturais (comparação com outros homens, crenças distorcidas sobre a masculinidade e sexualidade),
- Fatores religiosos (tabus, sentimento de culpa, punição).
Crenças culturais e o mito do “macho”
A noção de masculinidade que é construída socialmente pode reforçar as crenças irreais em relação ao desejo, excitação, ereção, tamanho do pênis e ejaculação, constituindo-se, muitas vezes, em fantasias de superpotências sexuais, que transformam os homens em máquinas sexuais, independentes de seus sentimentos e motivações. Desumanizados ficam em segundo plano diante das exigências e fantasias relativas ao desempenho sexual, levando-os a sentimento de frustração, incompetência, inferiorização, ansiedade e consequentes falhas na atividade sexual (Rodrigues, 2001).
No outro extremo, está o distanciamento do comportamento sexual por alguns homens que foram educados para ignorar o sexo, confinar até em pensamentos, minando-se de crenças e tabus, reforçando sentimento de culpa: a ideia de que o sexo é algo sujo, de que a masturbação é pecado e a ideologia da abstinência podem impedir que o homem explore a sua sexualidade de forma saudável. A falta de contato com o próprio corpo faz com que ele não desenvolva técnicas para prolongar o prazer e retardar a ejaculação. Nesse regime de desinformação, desconhecem a si mesmos e as suas potencialidades eróticas. Não deve ser fácil desprender-se desse condicionamento para permitir o desejo e a alegria do sexo até pouco tempo vetado.
Conclusão
Por vezes, as pessoas enfrentam reações orgânicas inesperadas à nível das respostas sexuais, o que gera sofrimento, angústia e pode afetar a autoestima. Os sentimentos de rejeição e insegurança também são relatados por aqueles descrevem alguma incapacidade para satisfazer o seu par. A terapia sexual pode ajudar a superar algumas dificuldades que tendem a “bloquear” ou “impedir” um fechamento sexual satisfatório e prazeroso para si e para o outro.
Bibliografia
Cavalcanti, R. & Cavalcanti, M. (2012).Tratamento Clínico das Inadequações Sexuais. 4 ed. São Paulo: Roca.
Kaplan, H. S. (1979). Disorders of sexual desire and other new concepts and techniques in sex therapy. New York: Brunner/ Hazel Publications.
Masters, W. H.; Johnson, V. E. (1970). Human sexual inadequency. Boston: Little.
Masters, William H. & Johnson, Virginia E.; Kolodny, Robert C. Heterossexualidade. [Heterossexuality]. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro, Atheneu, 1984. 398pp.
Munjack, Dennis J. & Oziel, L. Jerome. Sexologia: diagnóstico e tratamento [Sexual medicine and counseling in office practice: a comprehensive treatment guide] Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro, Atheneu, 1984. 398pp.
Nobre, P. (2006). Disfunções sexuais. Lisboa: Climepsi Editores.
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